Há quatro anos atrás, Caracas se candidatava a sediar os jogos pan-americanos que terminam amanhã. Foram quatro anos de problemas e incertezas. É verdade que a crise mundial influiu, mas a maioria dos problemas foi de ordem interna, fazendo com que durante muito tempo se duvidasse da realização dos jogos.
Faltava ainda muita coisa quando os quase três mil atletas das américas começaram a chegar a Caracas para os jogos. Os estádios e piscinas até que estavam em ordem, alguns foram construídos especialmente para o pan-americano, como a piscina; o ringue do parque "Nações Unidas", onde se disputou o torneio de boxe; e o Estadio Brígido Iriarte, para o futebol. Outros, sofreram reformas, como o estádio Olímpico, palco das provas de atletismo.
Mas Caracas deixou para o final a Vila Pan Americana. O lar dos atletas durante os 15 dias de competição. Aqui tudo era poeira, entulhos, improvisação. O exército foi convocado para apressar os trabalhos. Era comum soldados de vassouras nos ombros cruzarem a toda hora com os atletas. Além do calor, das instalações precárias e da correria, a vila tinha o agravante de ficar longe de Caracas.
Duas horas para ir duas horas para voltar e depois a mesma coisa para as finais. Simplesmente não tem jeito. Não pode fazer isso.
Os problemas de dificuldades eram consequencia de uma decisão inédita do governo da Venezuela. Que pela primeira vez na história dos jogos Pan Americanos decidiu bancar tudo sózinho.
O governo e os empresários nunca chegaram a um acordo quando aos jogos, o momento é grave na Venezuela. Além da crise econômica, vive-se um momento pré-eleitoral. Os cartazes que pelas ruas de Caracas saudavam os atletas de outros países, misturavam-se aos dos candidatos de partidos que vão disputar as eleições presidenciais de quatro de dezembro.
As atenções se dividiram ainda mais porque junto com a abertura dos jogos, a Venezuela pediu a terceira moratória deste ano, para uma dívida externa de dezoito bilhões de dólares.
O presidente Herrera Campis, ao visitar os estúdios da Rede Globo em Caracas, convidou o Brasil e os outros países do continente para uma reunião aqui semana que vem, onde será discutida uma negociação conjunta com os credores. Mas, antes dessa reunião, Herrera Campis vai discutir com o presidente da Petrobrás, Shigeaki Ueki, o aumento da cota de fornecimento de petróleo da Venezuela ao Brasil.
O petróleo é a principal riqueza da Venezuela e quem anda pelas ruas de Caracas nota que este país nunca esteve preocupado com o consumo de gasolina. Os carros são quase todos importados: carrões nada econômicos. A produção de alimentos quase não existe, vem tudo de fora. O bolívar, moeda nacional, depois de anos estável, foi desvalorizado em pelo menos 50%.
Foi dentro deste quadro que o governo decidiu assumir, sozinho, a realização do Pan-Americano ao custo de 300 milhões de dólares: aproveitou a motivação popular pelo bicentenário do herói nacional Simón Bolívar o Libertador, afastou os empresários, e logo na primeira semana de competição mostrou que administraria o prejuízo com habilidade política. Ninguém pagou ingressos nessa fase.
O povo venezuelano viu, de graça, os primeiros resultados de uma competição que pode aumentar ainda mais o beco sem saída da dívida externa.
Mas o importante também é competir, mesmo apelando para recursos nada recomendados.
Em meio a esses jogos pan-americanos, o resultado deste laboratório passou a ser mais importante do que os próprios resultados das competições. Este é o laboratório onde pela segunda vez se realizou o controle anti-doping nos jogos pan-americanos. Esses resultados chegaram, inclusive, a alterar o quadro de medalhas. O responsável por esse reviravolta foi o médico brasileiro Eduardo Henrique De Rose, 41 anos, vice-presidente da Federação Internacional de Medicina Esportiva e chefe da comissão médica da ODEPA. Durante três anos, o doutor De Rose preparou a equipe da ODEPA para esse rigoroso controle anti-doping. Em 79, a equipe da ODEPAtentou em Porto Rico um exame como este, mas faltavam uma equipe e material especializado, como este laboratório alemão, que o próprio doutor De Rose mostrou ao repórter Luís Fernando Lima.
Depois da urina entrar no laboratório, se preparam as amostras e essas amostras passam então inicialmente por um cromatógrafo de gases. Elas são injetadas em uma coluna e o computador então nos refere, através de gráficos, as substâncias e relaciona as substâncias existentes. E para a maioria dos estimulantes isto é o suficiente.
Há alguns tipos de estimulantes que o atleta possa ingerir que não vá ser detectado por essa aparelhagem.
Não. Todos são detectados, com exceção dos anabólicos que exigem o espectrofotômetro de massa, que nós vamos ver em seguida.
Bom, esse é o segundo exame. Exame quantitativo. Como é que ele funciona?
Passamos do "screening", nós temos uma amostra da substância, da urina. Isso é injetado, é processado pelo espectofotômetro de massa e depois é feito um relatório gráfico e numérico aqui. Isso então nos permite uma análise perfeita. (Qual são as substâncias...) Está é a prova definitiva da presença de substância.
Tem sido frequente os casos de dopping no esporte de alto nível nas competições internacionais, se nós considerarmos esta competição, tem sido muito mais do que frequente, foram cassadas 22 medalhas, cuba foi a mais prejudicada, teve que devolver sete medalhas de ouro, os Estados Unidos perderam 3 de ouro e o Canadá seis de ouro e uma de prata. O esperado duelo de medalhas dos jogos panamericanos tradicionalmente coloca frente-a-frente os atletas norte americanos e cubanos em todas as modalidades, porém em nenhum outro esporte esta luta é tão direta, inflamada, quanto no box.
Das doze lutas finais do torneio de box, seis vezes americanos e cubanos trocaram socos no ringue. E prevaleceu a tradição dos boxeadores cubanos, eles venceram quatro lutas e perderam duas, no total os cubanos subiram no pódio oito vezes para buscar medalhas de outro, os americanos apenas três, a Venezuela ficou com a outra medalha de ouro, o duelo entre cuba e Estados Unidos não ficou só no ringue, na quadra do parque Miranda as equipes femininas dos dois países jogaram duas vezes, na primeira fase, num jogo incrível, as americanas venceram por 3 sets a 1, na final, valendo a medalha de ouro, as cubanas jogaram com mais seriedade, venceram dois sets e pareciam seguras da vitória, mas as americanas reagiram, empataram o jogo, e só quinto set finalmente a vitória sensacional da equipe cubana.
No beisebol, mais uma vez, os cubanos cruzaram com os Estados Unidos e ficaram com a medalha de ouro. No jogo final, Cuba venceu os Estados Unidos por 8 a 1. Além de conquistar a medalha de ouro, Cuba afirmou sua superioridade nesse esporte tornando-se tetra campeã de beisebol em jogos Pan-americanos. Mas Cuba sofreu um sério golpe na corrida para passar das 64 medalhas de ouro, a meta de seus dirigentes, quando estourou o escândalo do doping no levantamento de peso. Os americanos foram os mais beneficiados, porque tiveram apenas um atleta punido. Em compensação, no atletismo, deixaram o caminho livre para Cuba em várias modalidades. Doze atletas voltaram aos Estados Unidos antes do início das competições, todos preocupados em não passar pelo controle antidoping. Os americanos foram melhores nas provas de pista, como nos revezamentos. E os cubanos dominaram as demais, como nos arremessos.
