Speak slowly please. I found this story on Fictionpress.net.
Quando o último rojão de luz cessa, meus olhos se abrem. Apoiada contra a grossa parede de vidro, posso ver através dela a escuridão que se torna meu planeta, ficando cada vez mais distante, me deixando para trás, sendo sugado pelo abismo. As lágrimas que escorrem por meus olhos são de uma coloração azulada, como meus olhos, mas não posso impedi-las de cair, e nem mesmo a mão apreensiva que agora toca meu ombro é o bastante para me acalmar. Ouço vozes atrás de mim mas sou incapaz de decifrar o que dizem, conversam em alguma língua estranha a qual eu não estou acostumada, o que é uma novidade, visto que devo ser fluente em pelo menos cinco línguas dentre as dezenas faladas por todo o universo. A mão que tocava meu ombro me puxa para trás, arrastando-me para longe da janela onde posso ver os últimos vestígios de meu planeta, as camadas de gelo protetoras que lhe rodeavam, as camadas que não foram o suficientes para proteger meu povo de um buraco negro. Mas eu sai viva, e isso ainda é uma incrível injustiça para mim. Desde que meu pai morreu, governar Solem sozinha tinha sido um trabalho e tanto, e agora vendo as consequências de minha incapacidade, me sinto ainda pior por não honra-lo.
Sou levada até uma cabine bem iluminada onde há apenas uma cama embutida, nenhuma janela. - Fique bem, Ástrid. - É a última coisa que eu ouço antes de sentir algo espetar minha nuca e minha visão escurecer. Não imaginava que meu estado fosse tão deplorável a ponto de precisar ser apagada por um tempo. Quando acordo, a primeira coisa que noto é uma porta extra defronte a minha cama. No exato momento que a vejo, tenho total certeza de que ela não estivera ali quando fui adormecida. Obrigo meu corpo ainda um pouco grogue a se levantar e caminhar até ela, cruzando o pequeno espaço entre mim e um futuro imprevisto. Abro a porta, é um corredor estreito e comprido, repleto de espelhos. No final do corredor há uma silhueta que de inicio não reconheço, mas conforme vou andando tomo conhecimento. Seus cabelos são de uma tonalização incomum de turquesa, enquanto sua pele é tão pálida que chega a parecer impossível, Tara está viva. Meu primeiro impulso é de me jogar em seus braços, mas quando tento, minhas pernas amolecem e eu caio em um baque surdo no chão, chamo a atenção da garota.
- Você não se enxerga mesmo, não é Ástrid? Olhe as condições que você está! - Sua voz irritante me traz de volta a realidade, com um pouco de esforço eu me levanto e vislumbro meu reflexo em um dos espelhos. Meus cabelos rosados estão embaraçados e mal cortados, algumas pontas estão um pouco chamuscadas, minha pele tem algumas feridas avermelhadas sobre a pele corada de meu rosto. Estou mais magra, mais fraca, as maçãs de meu rosto já não estão tão cheias como antes, isso me desespera. Tara me toma em seus braços e me aperta contra seu corpo esguio, com o intuito de confortar-me um pouco, e então as lágrimas azuladas voltam a preencher meu rosto.
- Onde estamos? - Minha voz sai um pouco mais quebradiça do que eu pretendia.
- A caminho da terra. - Meu corpo congela, meus olhos se arregalam, e me vejo a caminho da morte. Não, a terra não, tudo menos a terra, tudo menos aquilo. Em meu planeta dizemos que a terra é o lugar dos fracos e mal amados, onde nada se resolve na maneira correta. Solem não era nem de longe o planeta mais pacífico de todos, mas desde que astronautas terráqueos tentaram tomar nosso planeta com armas ridículas, gostamos de chama-los de fracos e incapazes, mas isso foi a anos, imagino que já tenham evoluído pelo menos um pouco desde que os banimos de nossas terras.
- Por que? - É o que escapa de minha boca entre um gemido de frustração e outro.
- Fica a dois anos de Solem, teremos tempo o bastante para procurar um planeta melhor até o buraco negro chegar lá. - Me parece uma ideia boa, um pouco egoísta talvez, partiremos da terra pouco antes deles serem engolidos pelo mesmo buraco negro que destruiu boa parte de minha espécie, isso toca meu coração, mas não fui criada para sentir pena de raças inferiores, e com humanos mesmo ainda, então simplesmente assinto com a cabeça e me retiro do corredor espelhado.
Tenho dois anos para me preparar para viver com os humanos, e isso é um tempo muito, muito curto.
Um ano e onze meses depois, me vejo sentada defronte a um espelho circular que reflete-me perfeitamente. Eu não mudei nada, é claro, nós paramos de envelhecer aos cem anos, quando temos a aparência de um terráqueo de dezenove. Atualmente tenho cento e oitenta e cinco, minha espécie vive em média até os quinhentos, estou nova. Minha beleza me faz aparentar uns dois anos a mais, então na terra, serei uma segundanista de dezessete anos, é assim que eles chamam os intermediários de lá, adolescentes, jovens, palavras estranhas em uma língua mais estranha ainda, inglês. Fui obrigada a aprende-la com mais ou menos cinquenta anos de idade. Estremeço ao ver meus longos cabelos rosados serem cortados um pouco mais a cima da cintura, e então serem tingidos de uma cor tão... Estranha. É escuro, é marrom, e eu não gosto. Sempre estive ciente de que meu cabelo deveria se adequar ao padrão denominado "normal" pelos terráqueos, mas ver meus fios rosados em uma cor tão opaca e sem vida quase me deixa depressiva. Com meus olhos já não é muito diferente, as lentes incomodam, são da mesma cor que os cabelos. Minha pele é coberta com uma camada de pó desconhecida, deixando-a caucasiana, isso me incomoda. - É mesmo necessário? - Resmungo, revirando os olhos.
Linda!